quarta-feira, 30 de maio de 2012

Peitos

Eu ia escrever um post sobre a Marcha das Vadias, que aconteceu agora no dia 26, mas certos fatos me levaram a mudar de ideia na última hora. Acontece que rolou um peitaço no final da marcha, lá na rampa do Museu Nacional, e acabei de saber que, por conta disso, uma amiga minha recebeu ligações com teor ofensivo. O assunto já vinha me incomodando há um tempo, dese que coloquei no facebook um ensaio dos meus extintos piercings nos mamilos. Metade da minha família está brava comigo por conta dessas fotos, mas eu não vou retirar, não fiz absolutamente nada de errado. Não sei por que as pessoas insistem em confundir nudez com erotismo ou pornografia. Para mim, são eles que vêem sexo em tudo.

Agora me explica: qual é o grande problema com peitos?

Todo mundo tem peitos, só que uns tem a permissão de mostrar e outros não. Até galinhas tem peitos, e eu não conheço ninguém que tenha uma ereção ao ver dois pedaços de peito de frango assado. Não entendo tamanha condenação, sério! A primeira coisa que vemos na vida são peitos. Quando a gente é criança, meninos e meninas correm pela praia sem camisa e sem problemas. Depois nosso peito começa a crescer, dói pra caramba, e a gente ainda tem de apertar eles em sutiãs, sem poder reclamar alto, pra nenhum homem ouvir.


Então o peito da mulher vira playground para os caras, e a gente é obrigada a cobrir a fonte do desejo. Sexo não é para moças de bem. Quando engravidamos, eles incham, enchem de leite e doem mais um bocado. Alimentamos as bocas dos mesmos babacas que dizem que é feio amamentar em público. Sofremos com o câncer de mama, envelhecemos e aturamos piadas. As que podem, dão logo um jeito de colocar silicone, gastar uma nota, passar por cirurgia e torcer para a prótese não arrebentar. Por mais difícil que seja, ainda é mais confortável seguir os padrões de beleza.

Não estou dizendo que quero ver todo mundo andando pelado por aí. A sociedade tem regras, we got it. Nós controlamos nosso calor, nosso desconforto, e continuamos cobrindo nossos peitos. Agora, vocês também controlem esse tesão reprimido de vocês e parem de confundir manifestação política com pornografia.

Cara, isso não tem NADA a ver com os pênis de vocês!

sábado, 12 de maio de 2012

Eu e o dia das mães

Minha mãe e seu exemplo de feminilidade
Finalmente vou poder colocar para fora um pouco da minha revolta com o dia das mães. Eu sei que datas comemorativas sempre geram seus contras, quaisquer que sejam, mas eu sinto que nenhuma delas tem tanto apelo emocional quanto o dia das mães.
Não tem como eu falar disso sem levar em conta minha experiência pessoal, afinal, tenho implicância com a data desde que perdi minha mãe, quando eu tinha 13 anos. Mas sei também que estou longe de ser a única pessoa no mundo a passar por isso. Todo ano, assim que a publicidade de dia das mães começa a passar na TV, meu corpo já vai apresentando os sintomas: fico irritada, mais suscetível ao pânico, com dificuldade de concentração, deprimida e com a imunidade baixa. Agora, pelo menos, eu conheço muito bem a razão do meu problema, até porque, já tinha alguma noção do mundo quando perdi minha mãe, já conversei isso um bocado na terapia e já estou no meu quarto ano do curso de comunicação, então pode-se dizer que eu entendo uma ou outra coisa de mídia. Nem assim eu consigo evitar esse mal estar. Agora, você imagina quantas pessoas devem estar em situação parecida, talvez não com os mesmos sintomas, mas, certamente, com a mesma sensação de inadequação.

Não estou falando aqui só dos "órfãos de mãe". Há uma maioria gigantesca que não é representada nessas publicidades. Vamos combinar, quantas mães se parecem com modelos de 25 anos? E quantas delas gostam e/ou tem tempo de cozinhar ou de arrumar a casa? Cadê as mães divorciadas? Cadê as mães chefes de família? Cadê as mães lésbicas? Cadê as mães negras? Na TV é que elas não estão. O que se vê é um modelo que não muda nunca: a mãe amorosa, bonita e dona de casa, sem opções. Ela deve ser assim. Empurram padrões de beleza e de comportamento e quem não se encaixa que arque com as consequências.


Me preocupa, principalmente, essa história do amor materno. É uma coisa imposta, não é uma coisa natural. A mãe DEVE ser a coisa mais importante na vida do filho, por isso fazemos propagandas apelativas, pra te lembrar disso. Você que não tem mãe ou cuja mãe é ausente, chega pra lá ou muda de canal, porque você não é público consumidor. Por outro lado, essa mesma mensagem é passada para as mães também, a partir do momento que você é mãe, você é obrigada a amar incondicionalmente sua cria, não porque você quer, mas porque a sociedade manda. O mesmo não é imposto ao pai, qual é a comoção que se vê quando um pai abandona o filho? Homem é assim mesmo, não é?
Eu não to falando tudo isso porque quero abolir o dia das mães, longe de mim. Eu falo porque acho que tá na hora de se refletir sobre mensagens como essas, sobre o lugar que é colocado a mãe e sobre as consequências disso. Porque, pelo que eu vejo agora, ser mãe ainda é um reducionismo do que é ser mulher ou, mesmo, do que é ser humano.

sábado, 5 de maio de 2012

Laços de sangue X Laços afetivos

Aproveitando meu último post, vou continuar refletindo um pouco sobre a questão do aborto na televisão. Comecei uma pesquisa no ano passado sobre como são tratados os bebês indesejados nas novelas e, sem muita surpresa, percebi que eles simplesmente morrem!

Ninguém quer sua emissora exposta a uma opinião pública que condene veementemente o aborto, mas também, nada de crianças de "sangue ruim" poluindo as sólidas famílias novelísticas. A solução é uma escada aqui, um acidente de carro ali, uma queda, um tropeço, qualquer coisa que justifique um aborto espontâneo.
Isso ficou muito claro na novela "Insensato Coração", em dois momentos. O primeiro foi com Irene, personagem de Fernanda Paes Leme, seu bebê era altamente indesejado, já que atrapalhava o romance de Pedro e Marina. Convenientemente, Irene é atropelada pelo vilão, Léo, e morre junto com o bebê. Problema resolvido!

Outro caso, bem pior, aliás, foi o de Cecília e Vinícius. Pra começar, Vinícius é um filho bastardo, super mau caráter, que espanca gays por
diversão. Completamente apaixonado, ele embebeda Cecília, a leva pra cama inconsciente e transa com ela sem camisinha. Quando descobre a gravidez, a irmã da moça, Leila, sugere um aborto, que Cecília nega imediatamente, dizendo que "jamais seria capaz de fazer isso com seu filho". Em vez disso ela opta pela segunda opção mais óbvia, o casamento, claro! Só que na porta da igreja, Vinícius é preso por ter assassinado um homossexual, então a esperta Cecília vai visitá-lo, fala para ele ficar longe do bebê dela e, tchanam, ele a empurra e ela magicamente perde o filho! Afinal, como é que ela ia se arriscar a ter um filho de um bastardo, super mau caráter, que espanca gays por diversão e ainda está no meio de seu romance com o rico Rafael? Jamais, né?

O que me surpreende é que a adoção nunca é nem sugerida. Aliás, na maior parte das novelas, a questão da adoção só é abordada quando motivação para o adotado procurar seus "pais verdadeiros". Sim, nas novelas os laços de sangue ainda aparecem quase como garantia para uma família feliz, e lá vamos nós, pisando num assunto que já é pouco incentivado por aqui. Agora deu para aparecer a questão do sangue até quando se fala de inseminação artificial, palavras como "mãe verdadeira", "pai verdadeiro", destituindo completamente a força dos laços afetivos.

A gente nem ouve falar em coisas como "parto anônimo", por exemplo, que é quando a mãe tem o direito de permanecer incógnita durante todo o processo do parto e entregar o filho para a adoção já no hospital, depois de 30 dias de nascido (tempo determinado para a criança ser reclamada por algum parente), aumentando em muito as chances do bebê ser adotado, já que a maior parte dos órfãos no Brasil não são adotados por já terem "passado da idade". Acho que o parto anônimo ainda não é nem legalizado por aqui, o que é estranho, se formos considerar o alto nível de crianças abandonadas que vemos nos jornais.

Isso sim é interessante, não é? Não temos uma política decente de prevenção de gravidez, sério, não temos! Até porque, lá vai a igreja proibir o anticoncepcional e a camisinha, não é? O aborto também não é legalizado. As políticas de adoção são complicadas e o parto anônimo é pouco discutido. Ainda temos a TV nos empurrando noções como "sangue do meu sangue". No fim das contas, realmente, só sobrou pra coitada da Cecília a opção de casar e/ou convenientemente perder a criança.

Comparo essas situações com o caso da Quinn Fabray (de Glee) ou da Juno (do filme "Juno). As duas adolescentes americanas tiveram gravidezes indesejadas e optaram por entregar os bebês para a adoção. Isso não quer dizer que foi fácil, não quer dizer que não teve sofrimento ou hesitação, as duas quase desistiram várias vezes e, no caso da Quinn, até rolou uma depressão pós-parto e tudo. Acho que tem de haver coragem, sim, por vários motivos. Da mesma forma que deve haver coragem para abortar, da mesma forma que deve haver coragem para escolher criar uma criança, da mesma forma que deve haver coragem para, em casos mais extremos, casar com alguém que você não gosta só para criar o filho. Coragem a gente é obrigada a ter, mas e quanto às opções?

Mas nem tudo está perdido, em "A vida da gente", a personagem Alice (Sthefany Brito) vive uma relação super agradável com os pais adotivos, apesar de insistir sempre em procurar os pais biológicos, por mais decepcionante que seja. Agora, nessa nova "Cheias de Charme", Rosário (Leandra Leal) é o maior amor do mundo com seu pai adotivo e até agora ela não apresentou nenhuma crise do tipo "preciso saber de onde vim". Ainda há uma esperança, quem sabe estamos caminhando, a passos de tartaruga, para um Brasil aonde os laços afetivos sejam realmente o que importa?